sexta-feira, 16 de março de 2012

O QUE VEM ANTES DO RELEASE DA TRILOGIA PEQUENOS CONTÁGIOS, OU MELHOR, DA ORGANIZAÇÃO DAS IDEIAS DESTA OBRA.  QUE SENTIMENTO ME LEVOU A ESSE MOMENTO ARTÍSTICO?

Tem momentos na vida em que perdemos, e é preciso perder para aprendermos o movimento de estarmos vivos. Perdemos pessoas, objetos, memórias, estimações. Mas talvez a mais crucial das perdas seja quando nos perdemos de nós mesmos.  Quando se perde a fé em você mesmo tudo se altera e numa perspectiva de mudança que parece não comportar a palavra movimento; a estagnação se instaura de tal maneira que o tempo passa não ser mais uma questão de experiência, mas da simples continuidade do relógio.  A percepção e reconhecimento de você no mundo são essenciais para que as relações possam acontecer de forma mais saudável, pois nós mesmos somos os elos entre nós e o mundo, e quando algum desarranjo acontece nessa relação à percepção também se altera, e talvez de maneira não tão prazerosa, não tão sensitiva, calando uma identidade no mundo.
Antes de o artista representar o mundo e sua composição, quer seja social, cultural, simbólica, estética na sua obra, concordo plenamente com o pensamento de Grotowski de que precisamos, antes de qualquer coisa sermos fieis a nós mesmos, nós somos assim a nossa obra, objeto de nós mesmos, encarnados em formas e pensamentos. Acredito numa arte que me comporte, que me caiba, mesmo na minha “deficiência”, pois somos feitos daquilo que nos falta também. Por isso resolvi me debruçar sobre a trilogia Pequenos Contágios. Ela fala das minhas emergências, ou melhor, de perguntas que me são emergentes, num momento em que duvido da minha capacidade de enxergar–me, da capacidade de enxergar o outro, como se os sentidos estivessem adormecidos, como se tivesse perdido a capacidade de alegra-me.
Esta trilogia não é um tratado sobre crise existencial, é uma prova em que me coloco na medida em que reconheço que existem possibilidades a serem exploradas mesmo quando um estado de letargia nos toma, pois como nos fala tão pontualmente Regina Célia Barbosa: “Os jornais afirmam ser o mundo uma grande tragédia. Pássaros cantando afirmam outras verdades, nem sempre trágicas, nem sempre harmônicas. Já os peixes apenas nadam e instalam sua existência no espaço aquático”. Nessa busca de avivamento que começo a construir as imagens de Cabeça Para Abelhas, Sinfonia Para Pombos e de Banquete Para Los Perros - Experimentar el tiempo y el espacio de la calle .
 Quero falar de coisas que acredito para ver se acredito mesmo, para ver se me encontro nesse discurso que construí nos últimos anos, de uma arte que me faça transcender, que me faça ter momentos de encantamento, de gozo, de reflexão; pois um conceito, uma ideia, uma filosofia só pode ser potente se for possível de ser vivida.
Antes de qualquer coisa que os pequenos contágios possam acontecer em mim, só assim, eu posso contagiar na vida real, contagiar o outro com o conceito deste trabalho.

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